segunda-feira, 18 de setembro de 2017

O Currículo Escolar da Educação Básica analisado sob uma Perspectiva das Questões Étnico-Raciais

Pensar as questões étnicos-raciais na educação básica não é possível sem analisarmos e debatermos sobre a formação curricular das instituições de ensino.
Uma vez que a escola apresenta um papel social emergente e que é neste espaço que as relações interpessoais e os vínculos de amizade e respeito no convívio em sociedade são fortalecidos e, nesta interação entre sujeitos, se faz possível presenciar as potencialidades do racismo e do preconceito racial, presentes na sociedade brasileira, ainda que, aparentemente, de forma silenciosa.
Esta ideia pode ser brevemente reforçada no próprio Referencial Teórico que orienta a prática educacional nas escolas brasileiras, que nos referencia dizendo que:

"É sabido que, apresentando heterogeneidade notável em sua composição populacional, o Brasil desconhece a si mesmo. Na relação do País consigo mesmo, é comum prevalecerem vários estereótipos, tanto regionais quanto em relação a grupos étnicos, sociais e culturais. A Educação & Sociedade, ano XXIII, no 79, Agosto/2002 127 Historicamente, registra-se dificuldade para se lidar com a temática do preconceito e da discriminação racial/étnica. O País evitou o tema por muito tempo, sendo marcado por “mitos” que veicularam uma imagem de um Brasil homogêneo, sem diferenças, ou, em outra hipótese, promotor de uma suposta “democracia racial”". (Parâmetros Curriculares Nacionais, vol. 10, p. 22)

É durante o tempo em que nos dedicarmos ao debate dialógico e à ação voltada para a conscientização e, principalmente, para a construção da identidade histórica dos nossos alunos e de nós mesmos enquanto professores e seres humanos ricos em história de vida e cultura que nossa identidade cultural irá se estabelecer e que fortaleceremos a uma ação educativa anti-racista, que ofereça oportunidades equivalentes a todos, pois somos todos sujeitos de direitos e precisamos ser vistos e respeitados por isto.

Ainda refletindo sobre o papel do educador na vivência social e no posicionamento perante a temática racismo e preconceito é de fundamental importância destacar as ideias de McLaren que nos permite perceber que:

"... o educador como agente revolucionário, ressaltando que se reconhecer dessa forma é mais do que um ato de compreender quem somos; é um ato de reivindicação de nós mesmos a partir de nossas identificações culturais sobrepostas e de nossas práticas sociais, de forma que possamos vinculá-las à materialidade da vida social e às relações de poder que as estruturam e as sustentam." (McLaren, 2000, p. 2)

Interessante que, nesta perspectiva, muitos educadores procuram agir em prol de uma ação que invista na conscientização e na reflexão sobre a linha histórica do escravismo brasileiro, ainda que neguem de forma ampla a existência da discriminação e da injustiça social perante os descendentes indígenas e afro-brasileiros. Existe um discurso que na prática nem sempre acontece. Uma ação reflexiva que no dia a dia aparece em forma de atitudes discriminatórias e que reforçam uma convivência baseada no racismo, ainda que de forma sutil e, em alguma vezes lúdica (através de brincadeiras entre colegas), mas que estão muito longe de formar uma consciência anti-racista através de uma perspectiva que trate as questões étnico raciais de forma justa e igualitária com o exercício de direitos e com a igualdade de possibilidades de ascensão social e financeira para todos os povos e etnias.

De acordo com Banks (1999), é possível que se propunha:

"... um modelo próprio de educação multicultural para ser um referente no dia-a-dia das salas de aula, baseado em cinco dimensões interligadas, que assim são explicitadas (Banks, 1999): 
- Integração de conteúdo: lida com as formas pelas quais os professores usam exemplos e conteúdos provenientes de culturas e grupos variados para ilustrar os conceitos-chave, os princípios, as generalizações e teorias nas suas disciplinas ou áreas de atuação; 134 Educação & Sociedade, ano XXIII, no 79, Agosto/2002 
- processo de construção do conhecimento: propõe formas por meio das quais os professores ajudam os alunos a entender, investigar e determinar como os pressupostos culturais implícitos, os quadros de referência, as perspectivas e os vieses dentro de uma disciplina influenciam as formas pelas quais o conhecimento é construído; 
- pedagogia da eqüidade: existe quando os professores modificam sua forma de ensinar de maneira a facilitar o aproveitamento acadêmico dos alunos de diversos grupos sociais e culturais, o que inclui a utilização de uma variedade de estilos de ensino, coerentes com a diversidade de estilos de aprendizagem dos vários grupos étnicos e culturais; 
- redução do preconceito: esta dimensão focaliza atitudes dos alunos em relação à raça e como elas podem ser modificadas por intermédio de métodos de ensino e determinados materiais e recursos didáticos; 
- uma cultura escolar e estrutura social que reforcem o empoderamento de diferentes grupos: promove um processo de reestruturação da cultura e organização da escola, para que os alunos de diversos grupos étnicos, raciais e sociais possam experimentar a eqüidade educacional e o reforço de seu poder na escola".

Nos impulsiona para uma ação pedagógica voltada para a conscientização e o respeito à diversidade cultural e étnico, as ideias de Dewey (1971):

"A educação não é preparação e nem conformidade. Educação é vida, é viver, é desenvolver, é crescer". (DEWEY, 1971: 29).

Portando, pensar na construção de uma sociedade democrática e na necessidade emergente de pensarmos a educação através do seu papel social e de formação de opinião coletiva, podemos ter em vista as interações que o sujeito faz, anteriormente, com os demais grupos a que pertence (família, igrejas, entre outros) e as interações que ele faz com o grupo escolar. Deste modo, é possível destacar que a construção desta identidade ideológica do sujeito, neste processo de conscientização caracterizada pela diversidade cultural e étnico-racial a qual pertencemos todos nós brasileiros é uma ação conjunta, mas também individual; é fruto de muito debate, mas também é sinônimo de lutas e conquistas pessoais, onde cada um de nós reconhece sua história, compreende suas vivências e os tempos em que elas estiveram inseridas e constrói as fortalezas necessárias para mudar o que tem que ser mudado e para apoderar-se no que lhe pertence por direito.




Um comentário:

  1. Nossa Ana! Que post comprido! O assunto merece! Muito importante estarmos estudando e refletindo sobre isso. Falar transmite nossos valores e forma o outro. Refletir tambem, assim como agir. Nossos atos inspiram. E fico aqui pensando em deixar registrado atitudes passiveis de serem incorporadas por professores em suas salas de aula. O que mais podemos exemplificar como estrategia de ensino e combate ao preconceito? Cartazes expostos na escola transmitem al[em da mensagem explicita modelos a serem valorizados pela sociedade? M[usicas? Jogos pedag[ogicos? O que mais? Sei de muitoas professoras que leem blogs de professoras e gostaria de deixar dicas pr[aticas para nossas colegas professoras. O que tu pensas sobre isso? Continua escrevendo que sigo por aqui acompanhando. Bjs Betynha :0) (Tutora PEAD2-UFRGS - VI Eixo)

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